O espírita que nunca vale nada


Recentemente eu escrevi uma matéria falando do modismo que se instalou, há muito tempo, no movimento espírita, onde o espírita adota o hábito de sempre afirmar que não vale nada, que está engatinhando, que não tem competência e que não significa nada.
Houve um fato comigo, aqui em São Paulo, fato este que tenho citado em palestras minhas, mas não escrevi ainda em matéria, o que faço agora, para conhecimento de todos.
Aconteceu, numa manhã de domingo, no auditório Bezerra de Menezes da Federação Espírita do Estado de São Paulo, o pré-lançamento do filme “A vida Continua”, quando a sua produção iria apresentar aos espíritas o relato de como o filme foi feito, com presença dos atores e várias pessoas do movimento.

Como sempre acontece nesses eventos, as pessoas se encontram na área de entrada (a FEESP tem um espaço, logo na entrada, onde fica a cantina) onde as pessoas se reúnem para um lanche e bate-papos.
Eu estava por ali, quando surgiu um companheiro que é um bom expositor espírita e também advogado, veio cumprimentar-me e começamos um bom bate-papo quando, de repente, começaram a se aproximar outros conhecidos do meio espírita, fazendo aquela rodinha de sempre.
Naturalmente, aos que chegaram, tomei logo a iniciativa de apresentar aquele que havia chegado primeiro, que estava conversando comigo. Só que fiz a apresentação assim:
- “Amigos, este aqui é o Fulano de Tal, que é um palestrante muito ruim e é também um advogado medíocre, que está há mais de vinte anos na advocacia, mas está engatinhando no direito, é um principiante que luta com muita dificuldade para ser um bom advogado...”
 Assustados, diante de uma apresentação daquele jeito, os companheiros ficaram olhando para mim, com os olhos arregalados, e eu percebia que, enquanto eu falava, o amigo advogado ia entrando num processo rápido de irritação, puxou-me levemente pelo braço para o lado e perguntou-me, indignado:
- “Alamar, o que está havendo, para você me apresentar dessa maneira para as pessoas? Você tem algum problema comigo? Eu não estou entendendo nada, porque você está me diminuindo assim...”
Eu disse para ele, diante dos outros:
- “Fulano, eu não estou inventando nada, não estou lhe diminuindo em nada, foi você mesmo quem disse isto para mim.
Você se lembra quando você foi meu entrevistado no meu programa de televisão, eu lhe apresentei para todo Brasil como um grande advogado, que sei que você realmente é, íntegro, ético, competente e honesto, e você, tomando do seu microfone e interrompendo-me, disse para o público.”
- “Menos, Alamar, Menos, Alamar! Gente, por favor, não acreditem em nada disto que o Alamar está dizendo, eu não sou nada disto, eu sou um advogado medíocre, estou engatinhando, me esforçando muito para ser um advogado razoável. É bondade dele”.
Meus amigos, creio que nem precisa dizer que foi constrangedor o momento. O interessante é que, felizmente, ele, assim como os demais, se viram envolvidos num processo de reflexão imediata, entenderam perfeitamente o recado, quando ele disse:
- “Alamarrrrrrr. Agora você me aplicou uma, com muita razão, e tocou-me profundamente no comportamento de uma forma que eu nunca parei para pensar direito...”
Os outros todos concordaram com ele:
- “Realmente, tem razão, eu também não tinha ainda atentado para este lado.”

A mania da auto desvalorização espírita

Chega a ser ridícula esta mania que muitos espíritas têm, conforme eu disse em artigo anterior, e creio que é assunto para repetir e para falar, assim como tenho falado muito nas minhas palestras, conforme aconteceu recentemente em todas as que fiz no interior do Rio Grande do Sul, em Salvador e nestes dois dias aqui em São Paulo e São Bernardo do Campo.
Por que espírita tem que dizer sempre que não vale nada, que não é bom em nada, que está engatinhando, que está fazendo um esforço enorme para ser apenas razoável e que não significa coisa nenhuma?
Que diabo de entendimento mais maluco da humildade é este, gente?
Quem foi que disse para os espíritas que ser humilde é praticar toda essa teatralização perante os outros?
Será que não dá para perceber que, ao contrário de estarmos fazendo convencer os outros de que somos possuidores de valores elevados, como a humildade, terminamos por nos expor ao ridículo?
É uma “forçação de barra” muito grande.
A levar em conta esse procedimento, não existe bom médico espírita, bom advogado espírita, bom engenheiro espírita, boa professora espírita... enfim, espírita não é bom em nada.
Tem sentido uma coisa desta?
Outra coisa absurda é a mania de sempre dizerem que não foram nada que presta na encarnação passada, que fizeram muita maldade, muita perversidade e até que mataram espíritas!
Será que foi isto mesmo? Será que no período médio que nós, que hoje estamos encarnados, vivemos a encarnação anterior, não existia ninguém digno, competente, honrado e honesto no mundo e só havia bandidos e assassinos?
Se observarmos bem, o “Allan Kardec Total”, aquele que a gente conhece melhor lendo todas as suas obras e não apenas o que chamam de básico do básico da doutrina, nunca se comportou desse jeito, nunca praticou essa teatralização comportamental e, por isto, sempre foi considerado como um homem de bom senso.
Creio ser necessário o movimento espírita repensar algumas coisas do seu comportamento, já que estamos falando de uma doutrina racional, onde deve prevalecer o bom senso.
Se alguém vem apresentar-me para os outros, dizendo que eu sou “o melhor advogado de São Paulo”, quando eu sei que sou apenas um bom advogado, mas longe de ser O MELHOR, aí sim, cabe a correção imediatamente e não se trata de humildade de fachada, mas se a pessoa diz que sou UM BOM advogado, e eu, de fato, tenho consciência de que me desenvolvo bem no campo do direito, o mais prudente, honesto, digno e coerente é apenas agradecer e não ficar com essa palhaçada de dizer que estou engatinhando na advocacia.

Onde se caracteriza, então, o excesso de vaidade?

É quando está instalada a absoluta falta de humildade.
É quando eu, caso fosse advogado, e alguém me pedisse um breve currículo para apresentar-me numa palestra e eu dissesse assim:
- “Diga que eu sou um dos MELHORES ADVOGADOS de São Paulo, que eu sou um dos melhores palestrantes espíritas...”
Eu teria alguma frustração e algum recalque instalado, daí necessitar de auto afirmação.
No meu caso, mais especificamente:
Eu sou pioneiro na divulgação do Espiritismo via satélite não apenas no Brasil como no mundo, sou pioneiro na iniciativa de realizar uma revista espírita em todas as bancas de revistas do Brasil, com qualidade semelhante às grandes revistas que o público lê, sou idealizador da primeira semana espírita de Nova York, etc... e não tenho a menor vergonha e constrangimento de dizer isto porque realmente sou e milhares de brasileiros sabem disto.
Mas daí eu pedir a alguém para me apresentar como o mais competente divulgador do espiritismo, o maiscompetente apresentador de televisão do meio espírita... etc. vai uma diferença muito grande porque eu estaria expondo também um dos mais elevados coeficientes de imbecilidade do meio espírita.
Se o elemento faz um esforço enorme para construir uma boa formação profissional, empenhando-se ao máximo no curso de graduação e pós-graduação, pesquisando, lendo muito, participando de congressos da profissão, se atualizando constantemente, correndo atrás de um doutorado e um mestrado, inteirando-se do avanço tecnológico na sua área, dedicando-se com amor no exercício profissional, consciente de que é considerado por todos como um profissional competente e de alto nível, por que tem que fingir que não é o que realmente é?
Você vai a um shopping center comprar roupas, pega mais de trinta peças e leva para o provador, onde vai experimentar, uma por uma, olhando para o espelho, bem olhado, para escolher seis peças que ficam BONITASem você, as compra e leva para casa. Aí veste-se com uma delas, vai a algum lugar e alguém diz que você está bonito ou bonita.
Aí você vem com aquele papo besta do “São seus olhos, é bondade sua”.
É ou não é o supra-sumo do ridiculo?
Temos que repensar isto, gente.
Ser espírita não é ser besta, é ser autêntico.
Faltar com a humildade não é admitir o registro daquilo que você realmente é, é correr atrás de parecer o que não é.
Já que a doutrina foi constituída em bases coerentes e de bom senso, não maculemos a sua imagem com fantasias e máscaras.     
           Abração a todos.
                                      Alamar Régis Carvalho